Nov 16, 2018

Brazilian Indigenous: Inter-American Court of Human Rights Issues a Report Condemning Violations to Indigenous Rights


After visiting several Brazilian cities and meeting with Brazilian authorities from 5 to12 November 2018, the Inter-American Court of Human Rights has issued a report that highlights the violations against indigenous rights, the frequent cases of violence against indigenous peoples, and the negligence of the State in the process of demarcation of indigenous lands. In regards to the latter, the Commission has affirmed in its report that there are severe structural problems in Brazil, which require urgent attention, a situation exacerbated by the progressive disempowerment of the National Indian Foundation (Funai) in the last four years. The report highlighted the harassment and threats directed to those trying to defend the indigenous communities and their rights, as well as the institutional discrimination against indigenous people, observing the occurrence of political actions and the mass removal of indigenous children from their families. Additionally, the report has described the living conditions of indigenous peoples in the state of Mato Grosso do Sul in particular as a severe humanitarian situation, as their confinement in small and crowded reserves restrains them from living a decent life. Finally, the report has observed the political and institutional drawbacks occuring in the Brazilian political landscape in relation to indigenous rights, having further recommended the execution and conclusion of the processes of demarcation of indigenous lands, especially in those related to large projects and business activities.

The article below was published by the Conselho Indigenista Missionário:

As violações aos direitos dos povos indígenas no Brasil estão entre os pontos centrais do relatório preliminar divulgado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) após sua visita ao país, encerrada ontem (12). A frequente violência contra indígenas e a negligência do Estado na demarcação de suas terras tradicionais foram pontos ressaltados no comunicado da Comissão, que fez recomendações ao Brasil.

Entre os dias 5 e 12 de novembro, comissários e comissárias da CIDH, órgão ligado à Organização dos Estados Americanos (OEA), reuniram-se com autoridades nacionais brasileiras e percorreram diversos estados do país, reunindo-se com a sociedade civil e movimentos sociais e colhendo relatos de violações de direitos humanos.

Em sua primeira visita in loco ao Brasil desde 1995, os representantes da Comissão visitaram aldeias em Altamira (PA), Santarém (PA) e Dourados (MS), além de também visitar quilombos, periferias de grandes centros urbanos, locais de acolhimento a migrantes e pessoas em situação de rua, entre outros locais de vulnerabilidade ou conflito social.

As observações preliminares foram divulgadas durante uma coletiva de imprensa realizada no Rio de Janeiro, na manhã de ontem (confira vídeo abaixo).

Em relação à demarcação de terras indígenas, o relatório afirma que há no Brasil “graves problemas estruturais que requerem atenção urgente”, situação que é agravada “enfraquecimento progressivo institucional da Fundação Nacional do Índio (Funai) nos últimos quatro anos”.

O relatório também chama atenção para o “assédio, ameaças e ataques a defensores, líderes e comunidades indígenas que defendem seu território”.

A situação vivenciada pelos indígenas no estado de Mato Grosso do Sul, especialmente a dos povos Guarani e Kaiowá, foi destacada no relatório como uma “grave situação humanitária”. Para a CIDH, o confinamento destes povos em pequenas reservas superlotadas e os conflitos resultantes dessa política “privam o Guarani e Kaiowá de uma vida decente”.

Além disso, o relatório destaca a discriminação institucional contra indígenas na região, salientando a ocorrência de ações policiais “sem a observância dos parâmetros de direitos humanos” e a remoção em massa de crianças indígenas de suas famílias.

Sobre o tema das demarcações de terras indígenas, a CIDH recomenda ao Estado brasileiro “executar e concluir processos de demarcação, especialmente aqueles vinculados a territórios afetados por grandes projetos e atividades de negócios de grande escala”.

Durante sua visita à região de Dourados, a Comissão visitou a Terra Indígena (TI) Guyraroka, cuja demarcação, em estágio avançado, foi anulada pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), por meio de uma sentença sumária que a comunidade busca reverter na Justiça.

“Após 14 anos, a comunidade ainda permanece fora da maior parte do seu território: dos 11.401 hectares identificados, os indígenas ocupam menos de 5%. A CIDH foi informada de que, como consequência da aplicação do marco temporal, a comunidade corre o risco iminente de ser despejada, mesmo desta pequena parte de suas terras”, salienta o relatório.

A restritiva tese do marco temporal, segundo a qual os povos indígenas teriam direito apenas às áreas que estivessem sob sua posse física em 5 de outubro de 1988, é um dos pontos criticados no relatório preliminar, junto com o Parecer 001/2017 da Advocacia-Geral da União (AGU).

Para a CIDH, a aplicação do marco temporal “ignoraria os muitos contextos de despejos forçados e deslocamento interno que impediram os índios d a posse real de grande parte de sua terra em 1988”.

Além disso, o relatório destaca que a tese é contrária “às regras e normas de direitos humanos internacionais e interamericanas, particularmente à Declaração Americana sobre os Direitos dos Povos Indígenas, uma vez que esta tese procura condicionar temporalmente a garantia aos direitos territoriais dos povos indígenas”.

No relatório preliminar, a Comissão chama atenção também para o que considera uma “interpretação restritiva” do direito à consulta livre, prévia e informada dos povos e comunidades indígenas.

“De acordo com as informações obtidas, esse direito estaria sendo aplicado exclusivamente a projetos de investimento, e não em todas as medidas legislativas e administrativas passíveis de afetar direta e indiretamente os povos indígenas”, afirma o órgão do Sistema Interamericano de Direitos Humanos.

O documento ainda chama atenção ainda para o modelo de desenvolvimento baseado em grandes empreendimentos e atividades de larga escala, como monoculturas, mineração e construção de hidrelétricas, ressaltando que recebeu informações sobre pelo menos 13 projetos que geram impactos negativos aos direitos humanos.

Outro tópico que recebeu considerações da CIDH foi a situação dos povos indígenas em isolamento voluntário ou de contato inicial da Amazônia, expostos a “extrema vulnerabilidade” em função de atividades como o garimpo e a retirada de madeira ilegal nas proximidades dos locais onde vivem.

A Comissão recomenda ao Brasil “assegurar o total respeito e garantia aos direitos dos povos indígenas em isolamento voluntário ou contato inicial, estabelecendo mecanismos eficazes de proteção para prevenir e erradicar o acesso de terceiros aos territórios onde esses povos estão presentes”.

A “urgente situação de saúde” das comunidades indígenas Yanomami, em função dos recentes surtos de sarampo na região que compreende o sul da Venezuela e o norte do Brasil, também foi destacada no relatório.

A CIDH recomenda, ainda, que o Brasil atenda com atenção redobrada as pessoas situação de “especial vulnerabilidade”, por meio de “uma abordagem diferenciada e oferecendo uma proteção especial”. Entre estas situações, a Comissão destaca a dos migrantes indígenas, como é o caso das famílias dos povos Warao e E’ñepa que têm atravessado a fronteira da Venezuela e buscado abrigo no Brasil.

A preocupação com a violência, com os altos índices de impunidade e com a falta de acesso à Justiça para familiares e vítimas de violações de direitos humanos foi outro ponto destacado no relatório. Os povos indígenas estão, para a Comissão, entre as “situações de risco especiais” em relação à questão da segurança.

Despejos violentos, assédio, ameaças e ataques a lideranças e comunidades indígenas que defendem e lutam por seu território são também citados como problemas enfrentados pelos povos indígenas no Brasil.

O relatório cita o caso do povo Xukuru, que levou o Brasil à condenação pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, em março deste ano. Em função da demora do Estado em demarcar sua terra e resolver o conflito instaurado, importantes lideranças do povo foram assassinadas e a regularização do território dos Xukuru ainda não foi concluída, depois de décadas.

Sobre o tema, a CIDH recomenda ao Brasil “estabelecer estratégias e metas específicas para a redução drástica no número de homicídios e crimes violentos no campo”.

Em um comunicado à imprensa sobre o fim da visita in loco ao Brasil, a Comissão destacou as intimidações sofridas pela comitiva que visitava a aldeia Açaizal, do povo Munduruku, em Santarém (PA). Durante a visita, na última quinta (8), indígenas e pessoas que acompanhavam a comitiva foram seguidos por fazendeiros em caminhonetes e assediados por eles e seus representantes.

“A comunidade indígena da aldeia de Açaizal em Santarém (PA) está submetida a práticas de coação, ameaças e tentativas de intimidação ao exercício do direito a defender seus direitos. Neste aspecto, a CIDH quer registrar publicamente que não apenas recebeu denúncias sobre estas práticas, mas também foi objeto direto de assédio na localidade”, afirma o comunicado.

Na semana passada, o Comitê Brasileiro de Defensores e Defensoras de Direitos Humanos e as procuradorias do Ministério Público Estadual do Pará em Santarém (PA) manifestaram repúdio à tentativa de intimidação ao organismo internacional.

Além da situação de povos indígenas, quilombolas e camponeses, a Comissão também faz recomendações ao Brasil sobre temas como migração, impunidade, discurso de ódio, discriminação, política de drogas e combate ao crime organizado, militarização das políticas de segurança pública, trabalho forçado ou análogo à escravidão, tráfico de pessoas, entre outros tópicos.

 

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